Peppa Dog e Peppa Pig
Fernando Lopes - Iscas Politicrônicas -Essa da foto é Peppa Dog, minha cachorra. Ela, evidentemente, não é famosa e rica como sua xará americana, Peppa Pig, mas tem lá seus atributos artísticos.
Como se vê na foto, a cara de coitada que ela faz é impagável. É uma atriz de mão cheia. Digo, pata cheia. Não tem nem pra Rin-Tin-Tin nem Lassie. A Peppa Dog é a maior atriz canina dos últimos tempos. Adora se fazer de vítima, mesmo quando é pega em flagrante roendo o controle remoto da TV ou algum sapato da minha mãe. Tremenda cara-de-pau. Ou focinho-de-pau, não sei. O cinema e a TV não têm jargão bem adaptado para as divas caninas ou demais espécies animais. E deveriam, visto que Peppa Pig tem até financiamento estatal.
Pois é. Mesmo rica e famosa, a Porcina americana tem direito a captar dinheiro fácil com a lei Rouanet. Não é espantoso que um sucesso da TV, que arrecada milhões pelo mundo, sinônimo de lucro garantido entre as crianças, uma verdadeira máquina de fazer dinheiro, tenha de ser subsidiada pelo Ministério da Cultura? Para os produtores e interessados na versão teatral da porquinha rosa, definitivamente não. Para estes, Peppa é “cultura” e deve ser paga do nosso bolso. Mas e o lucro da bilheteria arrecadado nos teatros lotados com o espetáculo? Ora, vai para o chiqueiro, digo, a casa da Porcina. Sim, é isso mesmo: O subsídio sai do nosso bolso e o lucro entra no dela, mesmo que não os tenha. Não há de faltar bolsos solícitos para amparar a porquinha nesse nobre mister. E claro… tudo pela cultura, óbvio, essa coisa tão necessária, tão importante, tão defendida. Aliás, danem-se museus (o do Ipiranga, na capital paulista, é um exemplo clássico; fechado há 2 anos por falta de verbas, e sem perspectiva de reabertura); danem-se as bibliotecas, danem-se as sinfônicas e as filarmônicas; danem-se as aulas de música ou balé para crianças; danem-se as feiras literárias, a produção de livros baratos; importante é “oinc-oinc” no palco. Pra essa gente, isso é cultura, sim, e merece dinheiro, muito mais do que um museu: http://www.oantagonista.com/posts/os-campeoes-nacionais-da-lei-rouanet/
É a cultura da boca-livre, como denunciou o Estadão de hoje (quinta-feira), relatando que simplesmente não houve fiscalização desse dinheiro nos últimos anos, servindo até pra pagar festa de casamento. Ah sim, o noivo festeiro está preso. Pelo menos isso!
Recurso público tem de ter prioridade, e ponto final. O resto é choro de interesseiros, disfarçado de amor às artes.
Por tudo isso, é triste ler de uns e outros que “cultura virou crime” no Brasil, como alega o grupo Porta dos Fundos: http://cinema.uol.com.br/noticias/redacao/2016/06/28/porta-dos-fundos-lanca-filme-com-leis-de-incentivo-cultura-virou-crime.htm. Eles são ótimos, não precisam do dinheiro do povo. E se precisam, estão na profissão errada.
Crime é ver os que pleiteiam dinheiro público para engordar seus lucros com risco zero de prejuízo, enquanto a verdadeira Cultura se esfarela. Crime é deixar nas mãos dos beneficiados a peneira para decidir o que é (e o que não é) cultura. Isso é simplesmente inaceitável. Não espanta que os apaniguados e beneficiários se desesperem quando se fala em reduzir tais subsídios, que deveriam ser utilizados em obras e ações mais necessárias. Não basta haver dinheiro público em demências como foi a famigerada rodinha de “atores” nus, uns com os dedos enfiados nos ânus dos outros? Pra quem não viu: http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2015/11/20/internas_polbraeco,507510/sesc-divulga-nota-de-esclarecimento-apos-peca-polemica-com-dedos-no-an.shtml
Antes que algum malandrão venha apontar o dedo sujo, ninguém está generalizando; um dos meus grandes amigos é ator e há realmente boa utilização da lei Rouanet em muitos casos. O problema é que a decisão não pode estar nas mãos justamente de quem é beneficiado. E nem venham falar em censura; cada um é livre para fazer o que quiser… mas não com dinheiro do povo. A esbórnia tem de acabar, junto com o lulismo e seus cabides de emprego e interesses, verdadeiras ações entre amigos bancadas pela Viúva. Como disse certa vez Margaret Tatcher, ”Não existe dinheiro público, existe apenas dinheiro dos pagadores de impostos”. Pagadores, vejam bem, e não “contribuintes”, como eufemisticamente são chamados no Brasil https://www.youtube.com/watch?v=WFIN5VfhSZo .
A Peppa americana levou R$ 1,7 milhão do nosso dinheiro. A minha Peppa, vira-lata brasileira, não levou nada – e nem há de pedir; muito embora tenha contribuído mais que a homônima no campo da cultura e das artes. Não só é uma atriz dramática de respeito, como inventou o Parkour canino (pula velozmente de um móvel ao outro sem por as patas no chão). De quebra, ajudou (muito) a tirar minha mãe da depressão, resultado de um AVC ocorrido há três anos, e de ainda colaborou para devolver-lhe o equilíbrio perdido, que tantas quedas dolorosas causou. Um excelente trabalho, e sem verba pública. Vai, cachorra!